O
ORFANATO DA SRTA PEREGRINE PARA CRIANÇAS PECULIARES,
de Ransom Riggs. Autor RAnsom Riggs, traduzido por Edmundo Barreiro e Márcia
Blasques, editado no Brasil pela Editora LeYa, e eu o comprei e li em 2012.
Exposto nas Livrarias
Curitiba, o livro chamou a atenção por mais de uma razão. Já estávamos da
metade para o fim do ano de 2012, e acompanhava com curiosidade o trabalho de
conclusão do Curso Superior de Escultura de uma colega, a Vanessa Loiola, que
expôs sob o título “A Posteriori” (vide: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/conteudo.phtml?id=1313775&tit=Exposicao-mostra-mortos-fotografados-como-se-estivessem-vivos-). O trabalho foi considerado controverso, pois
construído a partir de uma extensa pesquisa de fotos de mortos do fim do século
XIX, no costume de época de retratar os entes queridos logo após o falecimento,
vestidos e maquiados como se ainda estivessem vivos entre os familiares
sobreviventes. E foi bastabte criticado, durante sua construção,
fosse porque considerado mórbido, ou por sua clara referência narrativa “pouco
contemporânea” (?). Mas eu torcia por este, chamava minha atenção porque, ao
contrário da ostensiva maioria dos alunos-artistas, ela não se preocupou em
repetir discursos politicamente corretos, tampouco em fazer a arte abstrata
quase decorativa, ou da agressividade tão acondicionada e previsível que se vê como
ponto comum em qualquer exposição acadêmica.
A outra razão, foi a
frase simples de Tim Burton, colocada na contracapa do livro na forma de
pergunta: “Vocês tem certeza que não fui
eu quem escreveu esse livro? Parece algo que teria feito...”. Foi quando
folheei o livro, que é impresso em uma diagramação diferente e algo antiquada,
cheio de fotos em preto e branco e inequivocamente do século passado. Não
resisti. Além de admirar Tim Burton, tenho procurado por trabalhos que reúnam texto
e imagem, e que não sejam simplesmente histórias em quadrinhos, procurando uma
forma compatível comigo para desenvolver meu próprio trabalho. Já excluí idéias
boas na teoria e fracas na prática, porque alguém tentou isso antes e não
gostei do resultado. Sempre achei que aprender com a experiência alheia, sai
mais barato e dói menos. Então, comprei o livro, trouxe para casa na
expectativa de ler algo original, diferente, curioso.
Esta foi uma das
melhores compras que fiz no ano passado, e o primeiro livro que li que
REALMENTE intercala texto e imagem. Como informa o autor, no final do livro, “(...)
todas as imagens deste livro são fotografias antigas autênticas e, com exceção
de algumas que passaram por leve tratamento, não foram alteradas.”. Segue uma
relação dos colecionadores, proprietários de cada uma das imagens singulares e
curiosas. Sobre essa coleção de fotografias curiosas, muitas delas visíveis
experimentos das possibilidades de efeitos especiais ainda em sua fase primeira
e rudimentar, Rasom Riggs cria uma história de fantasia sobre pessoas com
poderes especiais e uma nesga no tempo, absolutamente fascinante.
O entrosamento texto
& imagem, é surpreendentemente simples e (para mim), novo. Primeiro, os
personagens são descritos dentro da narrativa. Só depois, a gente encontra a foto. Não é uma ilustração do texto. Ao contrário, no ritmo da narrativa, a gente relê na imagem, do quê já conhecia do texto.
Fiz, com prazer, o que se previa: a cada foto, eu voltava no texto, relia o que
foi escrito, voltava e comparava com a imagem. E assim, cada fotografia se transformava
em uma janela da imaginação, porque nunca nos contentamos em ver apenas aquilo
que nos indica o autor, mas fazemos da obra lida a referência para um número
infinito de associações.
Alguém pode explicar
porque quando algo nos fascina, tudo parece acontecer com uma sincronia
espetacular? Poucas semanas depois de terminar o livro, minha filha trouxe o
filme A INVENÇÃO DE HUGO CABRET (Martin Scorcese, 2012) para assistirmos
juntas. Fiquei fascinada. Era a mesma época, o mesmo contexto de imagem, uma imersão no passado. Depois de livro mais filme, quase saí atrás de uma máquina fotográfica antiga,
quase investi um dinheiro que não tenho só prá fazer um estúdio de revelação
de fotografias preto e branco em algum canto perdido da casa. Sonhei por uma
semana a fantasia de que, na “encarnação passada”, fui atriz de algum filme de
Meliers, que vivi naquelas casas vitorianas antiquadas. Retomei o desejo de
reformar a casa, acrescentar um sótão, instalar ali uma escrivaninha baixa e
escrever poemas a bico de pena. Queria ser uma criança peculiar. Queria viver
numa fenda do tempo. Queria viajar com um foguete de teatro até uma lua falsa.
Queria um autômato para colorir meu coração.
(Nunca vou entender
como alguém vive sem fantasia.)
Capa do livro (no Brasil, Ed LeYa) |
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